O título acima é a
célebre frase proferida por Cícero ao ver a corrupção e desvios da igreja de
sua época. A tradução da frase seria algo do tipo “Que tempos os nossos! E que
costumes!” Isso tem tudo a ver com o que vou compartilhar a seguir, pois, tenho
para mim, que se Cícero estivesse em nosso tempo, ao contemplar os caminhos da
igreja de hoje, não alteraria seu desabafo pessoal: O tempora, o mores!
Vivemos dias
negros da história do evangelicalismo cristão. Poderíamos afirmar que
presenciamos uma espécie de segunda “Idade das Trevas” onde se proliferam
superstições e crendices que nada mais são do que a franca deturpação da
simplicidade do evangelho de Cristo. O apaixonante e apaixonado evangelho que é
“o poder para a salvação de todo aquele que crê” (cf. Rm 1.16).
Não é de se
admirar o surgimento e a formatação de algumas espiritualidades estranhas,
caricaturadas que advogam para si o nome honroso de cristãs. Nada mais normal e
lógico do que isso: evangelhos estranhos, espiritualidades estranhas. Era de se
esperar que isso acontecesse em terras tupiniquins, já que a igreja brasileira
tornou-se uma cópia barata da igreja norte-americana que tem sido a precursora
da diluição do vinho ardente de Cristo.
O surgimento da
espiritualidade pop com suas celebridades e estrelas gospels, e da
espiritualidade hedonista que tem a teologia da prosperidade como seu principal
ícone representativo, têm conduzido às fileiras de cristãos na igreja como
manada entorpecida rumo ao matadouro de uma vida espiritual epidérmica de
discipulado inconsistente, vida de oração frívola e de total ou quase total
ausência de meditação e contemplação nas Sagradas Escrituras.
O que nos parece é
que uma grande parcela dos cristãos hoje em dia já não deseja ver cumprindo em
sua vida o chamado apóstólico de ser uma voz profética de contracultura em meio
à sociedade:
“E não sede
conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso
entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita
vontade de Deus” (Rm 12:2)
A grande
problemática velada por detrás do presente estado das coisas, é a falsa
esperança da vivência de uma espiritualidade cristã autêntica sem que isso
implique em se carregar a cruz todos os dias (cf. Lc 9.23).
Discipulado sem
cruz, sem negação do falso eu, sem a não conformação com os ventos
comportamentais de uma sociedade em franca rebelião ao Homem da Cruz é no
mínimo algo inconcebível como se querer que exista vida neste planeta se o
oxigênio aqui acabar. Assombra-nos o fato de que bem poucos queiram o martírio
de serem taxados como tolos por causa de Cristo (cf. Mt 5.11; Jo 15.19).
A cruz de Cristo é
o chamamento da morte para a vida. Não somente dos que ainda estão perdidos no
oceano de pecados, mas, sobretudo dos que já encontraram a rota para casa. A
Bíblia nos fala não apenas de um Senhor crucificado, mas, de homens e mulheres
crucificados também (cf. Gl 2.20; 5.24; 6.14). A cruz é o estandarte do nosso
Reino. É o brasão da família real a qual pertencemos. Sem ela não há
relacionamento com Deus. Mística sem a cruz de Cristo não passa de mais uma
superstição das trevas que cobrem a vida espiritual de muitos filhos e filhas
de Deus dentro das igrejas.
Na cruz de Jesus
temos o caminho para o retorno à espiritualidade genuinamente cristã. Na cruz
nos vemos face a face com aquele que nos mostra as perfurações de suas mãos e
pés, as marcas dos açoites, os hematomas das pancadas que lhe foram desferidas,
o cenho rasgado pela coroa de espinhos, e que nos diz no silêncio do encontro:
“Tudo isso fiz por você, porque te amo!”
A cruz também nos
confere a possibilidade de moldar toda a nossa vida como resposta a tão grande
paixão. Na verdade essa é a única resposta relevante que podemos dar: a entrega
total e sem restrições a essa amor maravilhoso de Jesus (cf. Jo 14:1). E quando
isso acontece vemos emergir uma espiritualidade bíblica porque se alicerça nas
páginas sagradas das Escrituras; cristã porque se fundamenta no Cristo vivo,
esperança nossa e mística porque proporciona-nos a experiência pessoal, no
silêncio, solitude e contemplação, de um encontro com aquele que é Totalmente
Outro, Transcendente e ao mesmo tempo imanente.
Oh! Assim como a
cruz de nosso Senhor atraiu a muitos para a salvação quando esta foi levantada
do solo, que hoje atraia novamente o coração de homens e mulheres, adultos e
crianças, para um novo e renovador mergulho nas profundezas da intimidade e do
seguimento de Jesus Cristo, nosso Senhor.
“(…) tome a cada
dia a sua cruz e siga-me”
Por Felipe Maia
Fonte: Vida Contemplativa
Via: Reformando-me
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