quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Os Dez Mandamentos: 6 – Não Matarás

A Bíblia começa com o Deus vivo criando coisas vivas. Todas as coisas são dele, por ele e para ele (Romanos 11.36). Tudo na vida deve sua existência a ele. Ele anima todas as coisas. Em resumo, ele é o Deus da vida, um Deus que é vivo e que gera coisas vivas. Mesmo quando o diabo tentou frustrar o seu espetáculo vivo, introduzindo a morte – espiritual e física –, Deus a sobrepujou por meio de Jesus. Nele estava a vida (João 1.4) e essa vida era como o alvorecer de um novo dia trazendo luz para todos os homens e dissipando as trevas do maligno (1 João 2.8). Em Jesus e por sua poderosa ressurreição à vida, Deus está soprando nova vida num mundo tenebroso e caído (2 Coríntios 5.17).

Tudo isso está por trás das duas palavras e seis consoantes do texto hebraico de Êxodo 20.13. Ele foi redigido de forma tão simples quanto em nossa Bíblia em português e com notável brevidade: “Não matarás”. Das três palavras hebraicas usadas na Escritura Sagrada para descrever a perda da vida, a que está em Êxodo 20.13 é a mais raramente usada e é muito mais específica. Normalmente, embora nem sempre, é usada em referência ao que chamamos “homicídio”. Homicídio não é meramente o ato de tirar a vida de alguém, mas de tirar a vida de alguém injustamente. Isso, é claro, significa que nem todo ato de matar é proibido. Há casos como a legítima defesa, a guerra justa, a pena de morte e outros, nos quais tirar uma vida não é apenas permitido, mas exigido.

Tirar injustamente uma vida é fazer o trabalho do diabo. É introduzir a morte em um lugar ao qual ela não pertence. É agir contrariamente ao modo como Deus opera.

Falando da obra de Deus, esse mandamento também nos guia positivamente. Não apenas nós não devemos tirar a vida de alguém injustamente, mas também devemos labutar com Deus pela preservação, proteção e promoção da vida. O Breve Catecismo de Westminster, P&R 68, põe da seguinte forma: “Que exige o sexto mandamento? O sexto mandamento exige todos os esforços lícitos para conservar a nossa vida e a dos nossos semelhantes”. Do mesmo modo, João Calvino enfatiza esse ponto aos seus leitores na Instituição da religião cristã:

Se está em nossas mãos o auxílio para conservar a vida do próximo, somos obrigados a empregá-lo fielmente, a procurar o que for para a tranquilidade dele, a vigiar para debelar o que é prejudicial; se ele estiver em perigo, a estender a mão em auxílio.[1]

Porque Deus é o Deus da vida e porque somos os seus filhos e aqueles que andam do modo como ele anda (1 João 2.6), nós somos necessariamente aqueles que trabalham pela preservação, proteção e promoção da vida. Esse mandamento, então, está profundamente arraigado na natureza divina.

Ele está, contudo, arraigado também na natureza humana. A humanidade é por natureza feita à imagem de Deus. Os homens refletem a Deus de modos que animais e plantas não fazem. Portanto, eles merecem maior grau de respeito e até de reverência do que tudo o mais na criação. A vida de um ser humano não deve ser tirada de modo vão ou fútil.

Uma vez que os homens são criados à imagem de Deus, nós somos, em um sentido bastante amplo e geral, membros de uma única família pactuados uns com os outros. “o homem tanto é a imagem de Deus como é a nossa carne. […] a não ser que se queira despojar a humanidade, devemos favorecê-lo [o homem] como a própria carne” (Calvino).[2] Tirar injustamente a vida de um membro da nossa comunidade é, de certo modo, apagar uma pequena parte de nós mesmos; é como tirar a vida de um membro da nossa própria família.

De modo ainda mais profundo, Jesus apela a esse mandamento e nos ensina que ele diz respeito não apenas a restringir nossas mãos, mas também a restringir nossos corações.

Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e: Quem matar estará sujeito a julgamento. Eu, porém, vos digo que todo aquele que [sem motivo] se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento; e quem proferir um insulto a seu irmão estará sujeito a julgamento do tribunal; e quem lhe chamar: Tolo, estará sujeito ao inferno de fogo (Mateus 5.21-22).

É na mente e no coração que o homicídio é concebido. “Veja se é possível nos irarmos contra o irmão sem ardermos por um desejo prejudicial” (Calvino).[3] Seguir esse mandamento é viver na paz e na alegria da unidade e da reconciliação.

Nós não podemos sequer pensar em tirar a vida de alguém injustamente sem pensarmos em Cristo, cuja vida foi perdida nas mãos de homens ímpios e injustos. A exigência de preservar, proteger e promover a vida foi completamente esquecida enquanto eles crucificavam o nosso Salvador. Contudo, Deus estava operando ali, satisfazendo a sua ira contra o pecado e preservando sua justiça ao perdoar pecadores homicidas como nós, que injustamente tiramos a vida de outros com nossas palavras, em nossos corações e por nossas mãos. E é essa graça que nos motiva a sermos um povo da vida, trabalhando com toda a força que há em nós para preservar, proteger e promover a vida, para a glória de Deus.

Rev. Brian Tallman é pastor da New Life Presbyterian Church (PCA) em La Mesa, Califórnia, EUA.

[1] N.T.: João Calvino. A instituição da religião cristã. Tomo I. Trad. Carlos Eduardo de Oliveira. São Paulo: UNESP, 2008, p. 382 (II, VIII, 39).

[2] N.T.: João Calvino. A instituição da religião cristã. Tomo I. Trad. Carlos Eduardo de Oliveira. São Paulo: UNESP, 2008, p. 383 (II, VIII, 40).

[3] N.T.: João Calvino. A instituição da religião cristã. Tomo I. Trad. Carlos
Eduardo de Oliveira. São Paulo: UNESP, 2008, p. 382 (II, VIII, 39).


Por: Brian Tallman. © 2015 Ministério Fiel. Tradução: Vinícius Silva Pimentel. Revisão: Vinícius Musselman Pimentel. © 2014 Ministério Fiel.

Heloisa Rosa - Jesus é o Caminho

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Os Dez Mandamentos: 7 – Não Adulterarás

O Breve Catecismo de Westminster afirma que o sétimo mandamento “exige a conservação da nossa própria castidade e da do nosso próximo, no coração, nas palavras e no comportamento” (P&R 71). Dito de outro modo, o sétimo mandamento nos chama a mais do que a mera abstenção da atividade sexual fora da união em uma só carne que é o casamento. Também nos chama à pureza sexual no pensamento e nas palavras.

À medida que certas expressões da sexualidade – outrora consideradas tabu – se tornam comuns e à medida que colegas, amigos e até membros da família compartilham notícias de um divórcio sem investigação de culpa,[1] de um relacionamento homossexual ou de uma união estável, mais e mais cristãos – especialmente quando amizades e laços familiares estão em jogo – se sentem impelidos a simpatizar em vez de condenar, a apoiar em vez de se afastar, de afirmar em vez de rejeitar. Contudo, ainda pesa sobre nós a obrigação de lutar com o texto bíblico.

Jesus afirma que, desde o princípio, Deus “os fez homem e mulher […], tornando-se os dois uma só carne”. Alguém qualificado para o presbitério deve ou ser solteiro e casto ou um homem de uma só mulher – o “marido de uma só esposa”. Jesus restaura a dignidade de uma mulher pega em adultério, mas também lhe diz que ela precisa parar de adulterar (João 7.53-8.11). Ele chama os escribas e fariseus para uma aplicação mais profunda e verdadeira do princípio da castidade. Até a luxúria – o ato de fantasiar com mulheres em geral em vez de desejar pactualmente uma mulher em particular – vem de uma imaginação adúltera (Mateus 5.27-30).

Com a pornografia, a cultura do “ficar” e expressões não convencionais da sexualidade se tornando comuns, o clássico ensinamento bíblico está se tornando menos popular em nossos tempos modernos. Contudo, se a verdadeira relevância da Escritura está no fato de que a Escritura não demonstra nenhum interesse em ser relevante – isto é, ela não demonstra nenhum interesse em ser adaptada, revisada ou censurada apenas para acompanhar as novidades do dia –, então a questão sexual é uma com a qual os crentes sinceros devem lidar. Devemos permanecer comprometidos em ser contraculturais sempre que a cultura e a verdade estiverem em conflito uma com a outra. Isso, somente isso, é o que tornará os cristãos verdadeiramente relevantes na cultura.

Jesus, que permaneceu um homem solteiro e celibatário por toda a vida, aprovou o sexo na relação marital entre homem e mulher. Ele inventou o sexo. Sexo não é proibido. Não é tabu. É uma dádiva, um convite ao marido e à mulher para que desfrutem do Éden juntos – nus e sem vergonha, íntimos e abraçados, expostos e não rejeitados. Provérbios convida o marido a encontrar satisfação nos seios da sua esposa. Cantares de Salomão retrata um marido e sua mulher admirando-se e ousadamente desfrutando o corpo nu um do outro. Paulo, também solteiro e celibatário, diz que, exceto para curtos períodos de oração, um marido e uma esposa fisicamente sãos devem entregar-se um ao outro sexualmente. A história culminará na consumação entre Jesus e sua noiva, a igreja – um “grande mistério” que todo crente, casado ou solteiro, pode antever no novo céu e na nova terra. E, contudo, a porneia – a abrangente palavra grega para a imoralidade sexual – representa qualquer afastamento da união marital entre homem e mulher.

Por que a Escritura é aparentemente tão liberal com respeito ao sexo dentro do casamento heterossexual, mas tão limitadora para qualquer outro cenário? Tim Keller diz que isso é porque o sexo é a mais prazerosa e a mais perigosa de todas as faculdades humanas. O sexo se parece muito com o fogo. Pode aquecer, confortar e purificar. Mas, se não for manejado com cuidado, pode também queimar, infectar, escoriar e destruir. Eu vi isso acontecer em inúmeras situações pastorais ao longo dos anos. “Há caminho que ao homem parece direito”, diz o provérbio sagrado, “mas ao cabo dá em caminhos de morte” (Provérbios 14.12).

Sendo assim, qual é o caminho reto nesta questão? Pretendo propor algo fora da caixa. E se nós cristãos, especialmente aqueles de nós que desejam ser sal e luz na cultura, mas que ainda afirmam a antiga visão judaico-cristã para o sexo, ficássemos mais preocupados com a ética sexual bíblica “aqui dentro” do que com aquela “lá fora”?

A sábia e fascinante Madeleine L’Engle nos ajuda com o seu lembrete de que “nós conduzimos pessoas a Cristo […] ao lhes mostrarmos uma luz tão encantadora que elas desejarão, de todo o coração, conhecer a sua fonte”.

A proclamação da luz será um tiro pela culatra onde não houver a demonstração da luz. Em vez de condenar o “sexo na cidade”, e se voltássemos a nossa atenção para sermos e nos tornarmos a “cidade edificada sobre um monte” a qual Jesus deseja que sejamos?

E se afirmássemos que ser solteiro e sexualmente casto (como Paulo e Jesus) é um chamado nobre, frutífero e “muito melhor”? E se começássemos a nos arrepender da casamentolatria, voltando a nossa ênfase para aquele casamento do qual todos os outros são apenas sombra – a união mística entre Jesus e a Noiva, a qual inclui os todos os crentes, maridos e mulheres, mas também viúvos e viúvas, divorciados e outros homens e mulheres não casados? E se focarmos em redimir a sexualidade na igreja primeiro, arrependendo-nos da pornografia, das piadas vulgares, dos comportamentos e vestes imodestos e outros hábitos que objetificam a imagem de Deus? E se nos tornarmos intencionais em reduzir o número de divórcios nos casos em que não há fundamento bíblico e nutrirmos o amor, as conversas demoradas, o andar de mãos dadas, a fidelidade, o perdão, o viver face a face (em intimidade) e também lado a lado (em missão) dentro dos casamentos?

Pois, a menos e até que nos tornemos esse tipo de comunidade contracultural entre nós mesmos, as pessoas “lá fora” farão ouvidos de mercador para todo o nosso zelo pela castidade bíblica. E com razão.

Rev. Scott Sauls é pastor titular da Christ Presbyterian Church em Nashville, Tennessee, EUA, e autor de Jesus Outside the Lines: A Way Forward for Those Who Are Tired of Taking Sides. Ele está no Twitter em @ScottSauls.

[1] N.T.: Divórcio sem investigação de culpa (no-fault divorce) se refere à possibilidade jurídica de um cônjuge requerer a dissolução do casamento sem precisar alegar a violação de um dever conjugal (por exemplo, os deveres de fidelidade ou de coabitação) da outra parte. Embora sejam comuns atualmente, legislações que permitem o divórcio sem investigação surgiram no Ocidente apenas na década de 1960.


Por: Scott Sauls. © 2015 Ligonier Ministries. Tradução: Vinícius Silva Pimentel. Revisão: Vinícius Musselman Pimentel. © 2015 Ministério Fiel.

Aba abba Laura Souguellis

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Os Dez Mandamentos: 8 – Não Furtarás

Um dos livros menos conhecidos de John Bunyan é intitulado Vida e morte do Sr. Homem-mau.[1] Nele, Bunyan narra a história de um indivíduo que era “completamente corrupto” desde a sua mocidade. Mesmo em sua infância, ele era o “cabeça dos pecadores” entre as demais crianças. Ele era muito dado a furtar, começando com pequenos atos como roubar frutas de pomares. Contudo, pecadilhos não confrontados inevitavelmente crescem mais e mais. Assim foi com o Sr. Homem-mau.

Depois de algum tempo, o Sr. Homem-mau decidiu que queria uma esposa, ou, mais especificamente, o dinheiro dela. Seguindo os perversos conselhos de seus companheiros ímpios, ele simulou religiosidade e conquistou a mão de uma donzela piedosa e rica. Credores prontamente vieram a ele em busca do dinheiro do casal. Com o dinheiro de sua esposa piedosa, ele lhes pagou o valor dos bens que prodigamente adquirira para os seus amores ilícitos. Sua esposa morreu de coração partido, porém descansando em Cristo, seu Salvador. Contudo, o Sr. Homem-mau continuou descendo pelo caminho da destruição.

O oitavo mandamento – “Não furtarás” (Êxodo 20.15) – parece direto na superfície. A maioria das pessoas confiantemente declara: “Eu jamais roubei um banco, logo, sou bom nesse particular”. Contudo, a Palavra inspirada do Deus que conhece a profundidade de nossos corações pecaminosos pinta um quadro muito mais amplo do que é proibido e requerido nesse mandamento. Foi esse o discernimento dos pastores e teólogos de Westminster, os quais conheciam as habilidades de seus corações manchados pelo pecado.

A base desse mandamento é o direito divino de propriedade: o fato de o Criador haver “de tal modo constituído o homem, que ele deseja e necessita do direito à exclusiva posse e gozo de certas coisas. […] [Essa] é a única segurança para o indivíduo e para a sociedade” (Charles Hodge). Assim, o mandamento nos proíbe de tomar injustamente qualquer coisa que não seja propriamente nossa. O furto pode assumir muitas formas, incluindo o roubo (Marcos 10.19), o seqüestro (Êxodo 21.16), o tráfico de seres humanos (1 Timóteo 1.10), a receptação de coisas furtadas (Provérbios 29.24), as transações fraudulentas (1 Timóteo 3.8), o uso de pesos e medidas falsos (Provérbios 20.10), a violação dos marcos de propriedade (Deuteronômio 19.14), a injustiça nos contratos (Deuteronômio 24.15), a extorsão (Salmo 62.10), os contratos de empréstimo imorais (Salmo 37.21), o tomar emprestado e não devolver (Êxodo 22.14), o ingresso em demandas forenses injustas (1 Coríntios 6.7), o plágio e assim por diante (ver Catecismo Maior de Westminster, P&R 142). O furto envolve não apenas a propriedade tangível, mas também reputações e idéias. Nossos tempos modernos e tecnologicamente avançados trouxeram à tona inúmeros modos de o coração pecaminoso e maquinador obter aquilo que não é seu por direito.

Na grande cidade de Éfeso, Paulo ministrou por três anos em sua terceira jornada missionária. Ele passou dois daqueles anos na escola de Tirano (Atos 19.9-10). Depois de ensinar durante o dia e passar tempo com seus pupilos, Paulo provavelmente se ocupava em seu ofício de fazer tendas, no amanhecer e no entardecer. Não surpreende, portanto, que ele diga na epístola aos Efésios: “Aquele que furtava, não furte mais; antes, trabalhe, fazendo com as mãos o que é bom, para que tenha que repartir com o que tiver necessidade” (Efésios 4.28). Em síntese, ele condena o furto e recomenda o trabalho diligente.

Isso naturalmente nos leva a considerar os deveres requeridos no oitavo mandamento, isto é, “a lícita obtenção e aumento das riquezas e do estado exterior, tanto nosso como do nosso próximo” (Breve Catecismo de Westminster, P&R 74). Nós recebemos a oportunidade e o privilégio de trabalhar, a fim de encontrarmos satisfação e realização no trabalho, de modo que possamos licitamente sustentar a nós mesmos e nossa família, assim como estar aptos a aliviar, de modo caridoso e generoso, as necessidades legítimas de outros. Desse modo, o nosso trabalho deve ser feito com diligência e alegria, pela percepção de que, em última instância, estamos servindo ao Senhor e Cristo (Colossenses 3.23-24). Paulo disse com franqueza aos crentes de Tessalônica: “Porque, quando ainda estávamos convosco, vos mandamos isto: que, se alguém não quiser trabalhar, não coma também” (2 Tessalonicenses 3.10). Ele falou isso como ummandamento (vv. 10, 12), não uma sugestão. Quando o final do dia chega, depois de havermos labutado com diligência e honestidade (e alegria) e colhido o fruto de nossos esforços, precisamos reconhecer que tudo o que temos vem da mão bondosa e graciosa de Deus. Ele escolheu nos abençoar e aquilo que recebemos dele não nos foi dado para desperdiçarmos, abusarmos ou perdermos. “O que é negligente na sua obra é também irmão do desperdiçador” (Provérbios 18.9, ACF).

O que aconteceu com o Sr. Homem-mau afinal? Ele chegou ao fim de sua vida enfermo em seu corpo e tão desesperadamente perdido quanto o ladrão impenitente do Calvário. A fim de não pensarmos presunçosamente que não somos semelhantes a ele em seu caminho de roubo, precisamos ser lembrados de que somos todos violadores da lei. Nossos primeiros pais furtaram da árvore proibida e todos os seus descendentes têm sido ladrões desde então. Os ladrões de todos os demais violadores da lei de Deus precisam ser lavados, santificados e justificados por intervenção divina (1 Coríntios 6.10-11). Contudo, o fato de vivermos como pecadores perdoados que foram lavados no sangue de Cristo não nos isenta da tentação de furtar. Precisamos vigiar atenta e constantemente os nossos corações e estar cônscios das sutilezas do pecado e da ardileza do tentador. Sendo assim, que lutemos para viver de modo irrepreensível, de modo a não levantar em ninguém a menor suspeita de que sejamos parentes do Sr. Homem-mau.

Notas:
[1] N.T.: “The Life and Death of Mr. Badman”, sem tradução em português.


Por: Robert W. Carver. © 2015 Ligonier Ministries. Tradução: Vinícius Silva Pimentel. Revisão: Vinícius Musselman Pimentel. © 2014 Ministério Fiel

Leonardo Gonçalves - Acredito (We Believe)

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Os Dez Mandamentos: 9 – Não dirás falso testemunho contra o teu próximo

“Que é a verdade?” A pergunta de Pilatos refletia mais um saturado ceticismo para com a própria idéia de verdade do que uma séria indagação filosófica. Quão trágico é que um homem incumbido de assuntos de vida e morte expresse uma atitude tão cínica. E quão diferente deve ser a atitude dos cristãos, os quais Jesus descreveu como aqueles que são “da verdade” (João 18.37).

O supremo valor da verdade é evidenciado pela presença do nono mandamento no Decálogo: “Não dirás falso testemunho contra o teu próximo” (Êxodo 20.16). O mandamento está mais imediatamente preocupado com a veracidade no contexto judicial. Deuteronômio 19.15-21 dá instruções sobre o testemunho em processos criminais. Uma única testemunha é insuficiente para lastrear uma acusação; deve haver duas ou três testemunhas (Deuteronômio 17.6; ver também Mateus 18.16; 2 Coríntios 13.1; 1 Timóteo 5.19). Se houver qualquer dúvida acerca da integridade de uma testemunha, os juízes devem “inquirir com diligência” e, se for descoberto ser ela uma “falsa testemunha” (no hebraico, eid-shek-er – o mesmo termo usado em Êxodo 20.16), ela deve receber a mesma pena que seria aplicada ao acusado. Assim, o perjúrio acarretava a máxima pena capital sob a lei mosaica.

Uma das razões para a proibição do falso testemunho é que a justiça pressupõe a verdade. Se a justiça há de ser realizada em uma corte judicial, todos os fatos relevantes ao caso devem ser conhecidos, o que pressupõe que as testemunhas falem “a verdade, toda a verdade e nada além da verdade”. Justiça significa que o acusado tem direito à verdade, independentemente de sua culpa ou inocência. O oitavo e o nono mandamentos estão intimamente ligados: dizer falso testemunho é uma forma de furto; é reter o que é licitamente devido a alguém. Um princípio semelhante se aplica à difamação: causar dano à reputação de alguém é furtar-lhe uma preciosa possessão (Provérbios 22.1; Eclesiastes 7.1).

Obviamente, o nono mandamento não se restringe aos tribunais de justiça. Como o restante da Escritura torna abundantemente claro, dizer a verdade é um dever moral fundamental e ser honesto é uma virtude moral básica. Os justos são caracterizados pela veracidade – com efeito, eles “amam a verdade” (Zacarias 8.19) –, ao passo que os ímpios têm “lábios mentirosos” (Salmo 31.18; 120.2; Provérbios 10.18; 12.22; ver também Salmo 101.7; Provérbios 12.17; Jeremias 9.5; Oséias 4.1-2). Uma das maneiras pelas quais amamos o nosso próximo é falando-lhe a verdade (Efésios 4.15, 25).

Por que dizer a verdade é tão importante? Como sempre ocorre na ética cristã, a resposta é fundamentalmente teológica. Deus é “o Deus da verdade” (Isaías 65.16). A verdade é um atributo essencial de Deus e da sua Palavra (João 4.23-24; 14.17; 15.26; 16.13; 17.17; 2 Timóteo 2.15; Tito 1.2; 1 João 4.6; 5.6). Em contrates, mentir reflete o caráter de Satanás e daqueles que o seguem (João 8.44; 1 Timóteo 1.10; 1 João 2.22; Apocalipse 21.8). Uma vez que somos criados à imagem de Deus, planejados para refletir o seu caráter, devemos falar a verdade assim como Deus fala a verdade. O nono mandamento, não menos do que o sexto, se sustenta na doutrina da imago Dei.

Embora a maioria dos Dez Mandamentos seja apresentada de forma negativa (“Não…”), cada um tem tanto uma aplicação positiva quanto uma negativa; cada um contém um “faça” assim como um “não faça”. Guardar o nono mandamento não é meramente uma questão de evitar afirmações falsas. Como reconhece o Breve Catecismo de Westminster na P&R 77, o mandamento também exige que ativamente busquemos e promovamos a verdade em todas as nossas tratativas com os outros.

Promover a verdade envolve muito mais do que simplesmente fazer afirmações verdadeiras. É perfeitamente possível enganar alguém sem lhe dizer uma única falsidade. Se eu escrevesse um relatório sobre alguém e enfatizasse suas imperfeições e falhas, enquanto ignorasse quaisquer pontos de valor ou virtude, cada frase no relatório poderia muito bem ser verdadeira, mas, considerado no todo, ele não promoveria a verdade. Promover a verdade significa dar uma descrição globalmente justa e acurada de como as coisas de fato são – mesmo quando isso vai contra os nossos próprios interesses. Semelhantemente, nós devemos falar a verdade com um grau apropriado de exatidão, nunca nos amparando em vaguezas, ambigüidades ou subterfúgios para obscurecer a verdade por motivos egoístas ou para fugir da responsabilidade por nossas palavras. Em suma, promover a verdade significa amar a verdade – não por causa dela mesma, meramente, mas movidos por um sincero amor por Deus e pelo próximo.

Numa época em que a confiança em figuras públicas está em crescente declínio, em que os meios de comunicação borram a linha entre notícia e publicidade, em que o termo spin se tornou lugar-comum[1] e em que o pós-modernismo erodiu o próprio conceito de verdade, é imperativo que os cristãos se coloquem à parte da cultura ao redor, como um povo marcado pela honestidade, integridade e fidelidade. Devemos ser pessoas de palavra, precisamente porque somos o povo da Palavra.

“Que é a verdade?” é uma questão filosófica importante, a despeito do cinismo de Pilatos. Mas uma questão ainda mais importante pode ser feita: “Quem é a verdade?”. O homem que estava perante Pilatos já havia dado a sua resposta (João 14.6). Se nós invocamos o nome de Cristo, nossas tratativas tanto com crentes como com incrédulos devem corroborar a nossa confissão. Apenas se formos conhecidos por dar testemunho verdadeiro é que poderemos fielmente dar testemunho da Verdade.

[1] N.T.: Em relações públicas, spin é uma forma de propaganda, realizada por meio de uma interpretação enviesada de um evento, o que pode incluir o uso de táticas maliciosas, enganosas e altamente manipulativas.


Por: James Anderson. © 2015 Ligonier Ministries.  Tradução: Vinícius Silva Pimentel. Revisão: Vinícius Musselman Pimentel. © 2015 Ministério Fiel.