segunda-feira, 4 de julho de 2016

Glutonaria


Embora o leitor não cite um texto específico, ele pergunta: “Por que a igreja parece quase silenciosa em pregar e ensinar sobre o assunto da glutonaria? Ouvi dizer que no passado a igreja pregou sobre isso, enquanto hoje nós praticamos a glutonaria!”.

A Escritura menciona o pecado da glutonaria mais de uma vez, embora não freqüentemente. Em Deuteronômio 21:20, os pais de Israel são ordenados a levar um filho rebelde e obstinado aos anciãos e dizer a eles: “Este nosso filho é rebelde e contumaz, não dá ouvidos à nossa voz; é um comilão e um beberrão.” Esse mandamento para levar um filho rebelde aos anciãos ainda está em vigor! Em Provérbios 23:20-21, Salomão admoesta o povo de Deus: “Não estejas entre os beberrões de vinho, nem entre os comilões de carne. Porque o beberrão e o comilão acabarão na pobreza; e a sonolência os faz vestir-se de trapos.” Os judeus consideravam a glutonaria ser um pecado sério, e por isso acusaram o nosso Senhor de ser “um homem comilão e beberrão” (Mt. 11:19; Lucas 7:34). Embora a glutonaria não seja mencionada por nome em Provérbios 23:1-3, a admoestação é importante: “Quando te assentares a comer com um governador, atenta bem para o que é posto diante de ti, e se és homem de grande apetite, põe uma faca à tua garganta. Não cobices as suas iguarias porque são comidas enganosas.” E seria bom ler também os versículos 4-8.

O leitor assume em sua pergunta que a glutonaria é um pecado, mas pergunta especificamente o porquê os ministros nunca pregam sobre ela. Eu não sei a resposta; pode haver muitas respostas: o próprio ministro come demais; quando um ministro condena a glutonaria desde o púlpito, as pessoas recebem tal admoestação com hilaridade (como aconteceu uma vez comigo); muitos na congregação são glutões e o ministro não quer ofendê-los; a glutonaria é geralmente considerada como um pecado insignificante, não digno da nossa atenção.

Uma razão, contudo, pela qual os ministros raramente pregam, se é que pregam, sobre esse pecado pode ser que a glutonaria é difícil de definir. Suspeito que um homem magro que coma tudo o que deseja e nunca engorde sequer uma grama, definirá glutonaria um tanto diferente da pessoa que come de forma reduzida e, todavia, engorda com tudo o que come.

Um homem que come com voracidade e nunca aumenta de peso pode ser culpado do pecado de glutonaria, enquanto uma pessoa obesa pode não ser. Nem todos os obesos são glutões, e nem todos os magros estão livres desse pecado. Os presbíteros na igreja não descobrem quem são os glutões entrando na casa de cada um e pesando os membros da família numa balança que carregam consigo.

Um problema adicional de nenhuma significância pequena é: Quanto uma pessoa pode comer antes de cair no pecado de glutonaria? Ou, na mesma linha: Quais comidas ele deve comer e quais deve evitar, para se guardar do pecado de glutonaria?

Há poucos glutões nos países de terceiro mundo onde o problema não é comer muito, mas manter-se vivo. Nós que vivemos em fartura devemos considerar que o pecado pertence especialmente aos nossos tempos e em nossas circunstâncias.

Contudo, eu creio sinceramente que os ministros conscientes que pretendem pregar todo o conselho de Deus, e que buscam aplicar essa Palavra de Deus à congregação, pregam sobre glutonaria, mas fazem isso sem mencionar especificamente o pecado. Como?

A quantidade do que como e bebo e o tipo de comida e bebida é tudo questões de liberdade cristã. Elas pertencem àquela área onde nenhuma lei deveria ser feita, onde o cristão, ungido por Cristo para ser rei na casa de Deus, governa sua vida pelos princípios da Escritura, e onde sua própria consciência é o seu guia – uma consciência cativa pela Palavra de Deus. E assim, um ministro consciente prega os princípios que fundamentam esse pecado. Quais são alguns deles?

Não devemos ficar preocupados sobre o que deveríamos comer e beber, pois Deus, que cuida dos pardais, prometeu tomar conta de nós (Mt. 6:25-34). Muita glutonaria começa por falhar em prestar atenção a essas palavras de Deus. Com geladeiras cheias, nós nos preocupamos constantemente.

Não devemos ser ascetas que, nos interesses de permanecer magro, evitamos os dons de Deus. Devemos recebê-los com gratidão, santificá-los com a Palavra de Deus e oração, e desfrutá-los como dons bondosos de Deus (1Tm. 4:1-5).

Nunca devemos pensar em alimento e comida como fins em si mesmos, a serem desfrutados por causa deles, mas devemos lembrar que nosso chamado é buscar o reino de Deus e a Sua justiça (Mt. 6:33). Isto é, comida e bebida nos são dados por nosso Pai do céu, para que possamos ter a força para continuar nossa jornada de peregrinos rumo ao céu, e, enquanto estamos ainda sobre a Terra, fazermos a obra do reino nos dada como tarefas por Cristo.

Se nos entregamos às comidas e bebidas dos tipos mais caros e não ajudamos aos pobres, a comida que comemos não somente nos engordará, mas se tornará em amargura dentro de nós sob a maldição de Deus. Deus se preocupa muito com os pobres!

Tão importante é o reino da justiça de Deus que suas obrigações excedem comida e bebida. Se necessário, como é para muitas pessoas, escolher entre a instrução cristã e a comida, entre a pregação e batatas, entre missões e pêssegos, a causa do reino de Deus deve vir em primeiro lugar.

Quando, em nossa fartura, comemos guloseimas e comidas exóticas que não são boas para nós, tornamo-nos glutões. Quando comemos qualquer comida que prejudique a nossa saúde, pecamos. Isso não significa que devemos ouvir aos médicos o tempo todo ou usar uma pequena balança na nossa mesa, ou contar as calorias constantemente, mas significa que a regra bíblica, “seja a vossa moderação notória a todos os homens. Perto está o Senhor” (Fp. 4:5) é uma palavra muito necessária em nossos dias. Ao comer e beber, bem como em todas as outras coisas, façamos tudo para a glória de Deus (1Co. 10:31).

Prof. Herman Hanko

Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto1

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